domingo, 29 de agosto de 2010

Dietrich Bonhoeffer - Não se Calou

“Alegrai-vos porque já achei a minha ovelha perdida” (Lc 15:6); “Ovelhas perdidas foram o meu povo, esqueceram-se do lugar do seu repouso” (Jr 50:6).




Poema de Dietrich Bonhoeffer
Pastor que combateu o nazismo e pagou com a vida, por lutar pela vida do irmão
Dezembro 13, 2007

A Ovelha Perdida
QUEM SOU?
(traduzido do inglês)

Quem sou?
Frequentemente me dizem que
saí do confinamento de minha cela
tranquilo, alegre e firme
como um senhor de sua mansão de campo.
Quem sou?
Frequentemente me dizem
que costumo falar com os guardiões da prisão confiada,
livre e claramente,como se eu desse as ordens.
Quem sou?
Também me dizem
que superei os dias de infortúnio
orgulhosa e amavelmente, sorrindo,
como quem está habituado a triunfar.

Sou, na verdade, tudo o que os demais dizem de mim?
Ou sou somente o que eu sei de mim mesmo?
Inquieto, ansioso e enfermo,como uma ave enjaulada,
pugnado por respirar, como se me afogasse,
sedento de cores, flores, canto de pássaros,
faminto de palavras bondosas, de amabilidade,
com a expectativa de grandes feitos,
temendo, impotente, pela sorte de amigos distantes,
cansado e vazio de orar, de pensar, de fazer,
exausto e disposto a dizer adeus a tudo.

Quem sou? Esse ou aquele?
Um agora e outro depois?
Ou ambos de uma vez?
Hipócrita perante os demais
e, diante de mim mesmo, um débil acabado?
Ou há, dentro de mim,algo como um exército derrotado
que foge desordenadamente da vitória já alcancada?

Quem sou?
Escarnecem de mim essas solitárias perguntas minhas;
seja o que for,
Tu o sabes, ó Deus: sou Teu!

Fonte: Práxis Cristã.

Materia do 3º ano - Facismo e Nazismo



Movimento político italiano fundado em Milão a 23 de março de 1919 por Benito Mussolini, que nele se apoiou para conquistar o poder e impôr à Itália um regime ditatorial de 1922 a 1945. Seu nome deriva de fascio, que era uma "insígnia e instrumento de punição dos litores romanos, composto de um feixe de varas e um machado. Como o feixe de varas, que representava a força, os culpados eram açoitados. Com o machado, símbolo da justiça, decapitavam-se os culpados." [1]

A Itália saiu da Primeira Guerra Mundial ferida, com o sentimento de ter sido ludibriada pelos Aliados, aos quais recriminava por não haverem satisfeito suas reivindicações territoriais em Fiúme e na Dalmácia. O orgulho nacional era alimentando por um sentimento de desforra. Por outro lado, o país era teatro de uma crise econômica e financeira: os preços subiam (o índice do custo de vida passou de 100 em 1914 a 300 em 1919 e a 400 em 1920), o orçamento apresentava um déficit crônico, o abastecimento era difícil, a reconversão suscitava problemas e a indústria revelava suas fraquezas. No Sul, a questão agrária mantinha-se; o mito da terra para os camponeses servia de pretexto para tentativas de ocupação dos domínios. Ocorria também uma crise social: a emigração para os E.U.A. havia-se tornado mais difícil e o superpovoamento se agravava. O desemprego e o aumento do custo de vida pauperizavam os trabalhadores rurais e os operários: 80% da população se proletarizaram.

Nesse clima geral de rancor, miséria e inquietação, o fascismo desenvolveu-se, afirmando-se desde o início "reacionário, antiparlamentar, antidemocrático, antiliberal e anti-socialista". Aos patriotas e aso ex-combatentes decepcionados com os resultados da guerra, oferecia uma doutrina nacionalisa e belicosa; às inquietações provocadas pelo perigo vermelho, opunha um desejo feroz de combater as Internacionais socialistas; diante de um poder fraco e sem autoridade, defendia a concepção do Estado totalitário: Tudo está no Estado, nada contra o Estado, nada fora do Estado. Sua fórmula era: acreditar, obedecer, combater. Sua verdadeira doutrina era a ação: "O fascismo não foi alimentado desde o início por uma doutrina previamente elaborada nas mesas de trabalho, nasceu de uma necessidade de ação e consistiu na ação; não foi um partido: ao contrário, nos dois primeiros anos, foi um antipartido e um movimento; o nome que dei ao movimento traduzia seu caráter", dizia Mussolini. O caráter ambíguo da doutrina fascista explica o fato de entre seus numerosos adeptos encontrem-se republicanos, nacionalistas, ex-combatentes, descontentes, arrivistas, aventureiros e idealistas. O movimento recebeu também o apoio da grande indústria, que buscava uma reação de direita para conter o ímpeto revolucionário dos socialistas. Fora das cidadaes, o fascismo encontrou ampla aprovação entre os pequenos proprietários rurais. O fascismo, portanto, não foi o movimento de uma classe ou de uma categoria social ou profissional; exprimiu interesses diversos, e até divergentes, num amálgama de aspirações que buscavam uma mudança rápida sem se opor à "maneira forte" de consegui-la.

Um dos esteios do regime fascista foi a pequena burguesia: "(...) na altura em que se reuniu o Congresso de Roma, em 1921, dos 150 mil inscritos que formam os quadros do Partido Fascista, encontramos 18 mil proprietários de terras, 14 mil comerciantes, 4 mil industriais, 10 mil membros de profissões liberais, 22 mil empregados (dos quais 1/3 são funcionários) e cerca de 20 mil estudantes, ou seja, perto de 90 mil membros não-operários. O resto são trabalhadores agrícolas (37 mil) e 24 mil trabalhadores urbanos, na maioria desempregados e funcionários públicos. Em 1930, a proporção não variava, e dos 308 chefes fascistas italianos, 254 provinham da pequena burguesia." [2]

Em novembro de 1921, o movimento - que se havia tornado um partido - manifestou claramente seu desejo de conquistar o poder. Os estadistas liberais, ainda no poder, eram inconscientes; as cumplicidades que o movimento encontrou no país multiplicaram-se; por isso mesmo, a marcha sobre Roma que Mussolini organizou a 22 de outubro de 1922 mais parecia uma parada militar do que uma revolução: a 30 de outubro, Vitor Emanuel III convocou Mussolini a Roma para lhe confiar a tarefa de formar o novo governo.

De 1922 a janeiro de 1925, ao menos aparentemente, não se constatou nenhuma mudança substancial no seio do Estado: a vida parlamentar continuou. Mussolini investido de plenos poderes pela Assembléia, criou o Grande Conselho fascista, que realizou a simbiose partido único-Estado totalitário; uma nova lei eleitoral permitiu-lhe, conseguir, nas eleições de abril de 1924, 64,9% dos votos e 406 cadeiras no Parlamento. O deputado Giacomo Matteotti, líder do partido socialista, denunciava sistematicamente, da tribuna do Parlamento, as violências e arbitrariedades cometidos pelos "camisas negras" e acobertadas ou estimuladas por Mussolini (30 de março de 1924); exatos dois meses seguintes foi seqüestrado às margens do rio Tibre por cinco indivíduos, que o assassinaram. Seu corpo só foi encontrado dois meses mais tarde, no interior da Itália. Os criminosos forma julgados em 1947 (dois morreram nesse meio-tempo) e condenados a trinta anos de prisão. O fato provocou a indignação na opinião pública e deu novas forças à oposição. Mas o rei apoiou Mussolini e o fascismo superou a crise.

A 3 de janeiro de 1925, Mussolini anunicou o estabelecimento de um regime totalitário. Uma série de leis e de disposições arbitrárias pouco a pouco transformaram Mussolini em "Duce": os adversários forma presos, deportados para as ilhas Lipari ou forçados ao exílio, os partidos forma dissolvidos; um tribunal foi instituído para julgar os delitos políticos; a milícia, exército do partido, foi reforçada (enfrentou a oposição do exército regular); uma polícia secreta, a O.V.R.A., foi criada.

Mussolini dispunha então dos meios que lhe permitiram organizar o país segundo as normas fascistas. O enquadramento de toda a população foi preparado. Todos os italianos eram arregimentados desde os seis anos de idade. Os professores prestaram juramento ao regime, davam aulas em uniforme fascista, comentavam em classe os discursos do Duce. A história foi revista para exaltar a grandeza de Roma e a nova grandeza do Estado fascista. De um modo geral, através do rádio, da imprensa, do cinema, toda a população foi condicionada; uma encenação constante engarregava-se de criar permanentemente uma atmosfera de grandeza para a glória do regime. O partido era a fonte de recrutamento dos funcionários, e, era o Grande Conselho fascista que escolhia os deputados. Todos quadros admnistrativos do Estado eram colocados sob a direção desses dois órgãos, que se achavam representados em todos escalões.

As realizações do regime fascista não foram desprezíveis. A "batalha do trigo" permitiu que a produção passasse de 50 milhões em 1925 a mais de 80 milhões em 1933. 1,5 milhões de hectares de terras foram beneficiados. Mais de mil centrais hidroelétricas foram construídas de 1922 a 1939. A produção de aço foi triplicada entre 1922 a 1939, e a do alumínio foi multiplicada por dez. Uma política de grandes obras foi posta em marcha a fim de assegurar a glória do regime, distribuindo salários (secamento dos pântanos Pontinos, construção de auto-estradas e de estádios). Mussolini empreendeu também uma campanha a fim de elevar a população a acerca de 70 milhões de habitantes em 1960: a emigração foi severamente limitada. Mas essa política fracassou, assim como fracassou, no conjunto, a política econômica.

Nesta área, sucederam-se várias etapas: após um livre-cambismo e, a seguir, um liberalismo (desnacionalizações), em 1925, bruscamente, instalou-se a planificação, acompanhada de um protecionismo severo e de certa austeridade. Em 1930, os salários italianos eram os mais baixos da Europa. A prosperidade industrial era fictícia, o desemprego aumentava. O governo foi obrigado a recorrer a novos impostos e a empréstimos compulsórios, que empobreciam ainda mais as classes menos favorecidas.

Mussolini combateu os conflitos de classes sociais instituindo corporações que deveriam aumentar a produção e aproximar os homens uns dos outros: tal instituição, porém, permaneceu artificial. Ainda com o intuito de pôr fim às divisões internas, Mussolini assinou com o papa os acordos de Latrãs (1929); a hostilidade entre a Igreja e poder civil, ressurgiria porém, logo após.

Em 1936 situa-se o apogeu do fascismo: a proclamação do Império, após a agressão contra a Etiópia, o fracasso da Liga das Nações, incapaz de pronunciar sanções eficazes contra a Itália, a falta de firmeza da França e da Inglaterra para apoiar a Etiópia, a aproximação com a Alemanha nazista e a intervenção na guerra da Espanha, tudo isso parecia consagrar a vitalidade do regime.

Ainda que sua popularidade tivesse diminuído bastante, sobretudo no seio da alta burguesia, o fascismo mantinha-se extremamente poderoso e praticamente invulnerável, pois se apoiava num aparelho policial eficaz.
texto retirado de: http://www.estudodofascismo.hpg.com.br/igreja.html



FASCISMO E A IGREJA



Em 1929, Benito Mussolini e Pio XI assinaram o Tratado de Latrão, no qual se reconhecia a soberania do Estado do Vaticano. Este tratado, porém, não impele a católicos a acolherem a doutrina fascista, pois alguns incautos não sabem, mas a doutrina fascista é incompatível com o catolicismo, com a sua doutrina social, na qual se encontra o princípio da subsidiariedade. Segundo este princípio, "uma sociedade de ordem superior não deve interferir na vida interna de uma sociedade inferior, privando-a de suas competências, mas deve, antes, apoiá-la em caso de necessidade e ajudá-la a coordenar sua ação com as dos outros elementos que compõem a sociedade, tendo em vista o bem comum". Portanto, como o regime fascista é caracterizado por uma intervenção muito acentuada do Estado que ameaça a liberdade e a iniciativa pessoais, um regime que pretende controlar todas as ações e relações sociais, como todo regime totalitário é incompatível com este princípio. Não apenas fere este princípio, como também confere ao estado um culto exagerado, a "estalolatria". Outrossim, encontra-se no Programa dos Fasci uma negação a estruturas dogmáticas. Desta forma, o verdadeiro católico não pode ser fascista.
Texto retirado de: http://www.estudodofascismo.hpg.com.br/igreja.html

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Materia do 2º ano A1,A2 e A3

MODERNISMO s.m. Movimento artístico-literário que surgiu no Brasil após a Primeira Guerra Mundial. - Foi uma violenta reação ao subjetivismo decadente do romantismo e ao formalismo rígido e sofisticado da poesia parnasiana.
Reivindicou a necessidade de renovação radical dos meios, das formas e das fórmulas de expressão artística, estimulando a pesquisa da realidade brasileira. O ideal era estabelecer uma consciência criadora nacional, integrando o homem brasileiro em sua brasilidade. A literatura passou, então, a tratar de temas tipicamente nacionais, criando, por conseguinte, uma língua literária própria.
Dois aspectos marcantes da ficção anteciparam-se a este movimento: o regionalismo (que refletia a linguagem e as particularidades da regido em que se desenvolvia a trama) e a literatura urbana (que fixava os tipos, os costumes e a linguagem da cidade).

O marco oficial do modernismo no Brasil foi a Semana de Arte Moderna, em 1922. Num país saturado de influências estrangeiras, proclamou-se um nacionalismo intransigente.
De 1922 a 1930, predominou uma orientação revolucionária, de escândalo e destruição da arte tradicional (simbolista e parnasiana). Essa primeira fase foi polêmica, marcada por uma busca de originalidade. O grande líder foi Mário de Andrade. Seu livro de poemas, Paulicéia desvairada (1922), inaugurou definitivamente o movimento. Outro modernista de grande destaque foi Oswald de Andrade. Sua obra de estréia foi Os condenados (1922).

A partir de 1930, o modernismo se estabilizou. Pouco a pouco, as posições extremadas de escândalo e destruição da arte tradicional foram abandonadas. Era importante então, aumentar a produção de obras genuinamente brasileiras.
Na ficção, a geração de 30 teve nomes destacados como José Lins do Rego, Rachel de Queiroz, José Américo de Almeida, Graciliano Ramos, Jorge Amado, Amando


Desapego
A vida vai depressa e devagar
Mas a todo momento
penso que posso acabar
Porque o bem da vida seria ter
mesmo no sofrimento
gosto de prazer.
Já nem tenho vontade de falar
senão com árvores, vento,
estrelas, e águas do mar.
E isso pela certeza de saber
que nem ouvem o meu lamento
nem me podem responder.
Cecília Meireles

Suas poesias apresentam a transitoriedade da vida e elementos que transmitem leveza, como a água, o vento, o mar, a música.
Pela musicalidade dos versos e espiritualidade dos temas, é considerada uma poetisa neo-simbolista.


http://www.sitedasartes.hpg.com.br/poesia6.htm

Crise de 1929 no Brasil
Em 1929 ocorreu a Grande Depressão nos Estados Unidos. No Brasil este acontecimento está entrelaçado com a Revolução de 30 e a Crise do café. Apesar disto as causas da crise do café não foi apenas esta.
O café, em toda a República Velha, foi um produto de grande representatividade em nossa economia, chegando a atingir até 70% das exportações. Por isto, a decadência do café era um dos grandes problemas e medo do governo brasileiro, já que se o café padecia, a economia padecia também.
Na realidade, os problemas com o café, já vinham destes 1900 , quando as plantações começaram a produzir super-safras, e como já foi dito anteriormente uma das medidas para resolver esta situação foi o convenio de Taubaté, que acabou por estimular o surgimento de novas áreas de plantio.
Então, para piorar a situação, ocorre a crise de 1929, contribuindo ainda mais para diminuição do preço do café. Além disto, a crise do café também esta vinculada com a produção arcaica e sem planificação do café, trazendo como conseqüência imediata à oscilação de preços e ruína de muitos produtores, a crise na infra-estrutura econômica do país, a política de valorização que enriquecia os intermediários e especuladores em detrimento dos produtos, o que abriu caminho para os países concorrentes.
A crise, porém, não foi apenas no setor cafeeiro. Vários outros produtos também
foram atingidos, como a carne em conserva, couro, manganês, açúcar, borracha, cacau, fumo, erva mate e óleos.
O setor industrial também foi atingido. Inúmeras empresas faliram, outras reduziram sua carga horária. Além disto, os salários abaixaram, tanto no setor industrial quanto no setor agrícola.
Assim podemos ver que a crise no Brasil não foi apenas no setor cafeeiro, mas de toda a economia brasileira. Além disto, a crise não era apenas um reflexo da grande depressão, mas uma crise causada por um sistema econômico com diversos problemas.
Vale ressaltar que a crise afetou, também, na política. Na Europa, foi uma das causas dos regimes totalitaristas se espalharem, o que influenciou Vargas no Estado Novo. Nos Estados Unidos, com Roosevelt e o New Deal, uma política reparadora para a crise que influenciou algumas decisões do governo de Vargas.

www.scribd.com/doc/.../Crise-de-29-no-Brasil -

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Estudo sobre a escravidão no Brasil - 1º ano

Quilombo e a resistência negra.

Desde o século XVI os escravos fugiram sozinhos ou em grupos do campo para a cidade ou da cidade para o campo. Após fugirem, montavam acampamento em áreas despovoadas e de difícil acesso.
A estes acampamentos deram o nome de “quilombos” ou” mocambos.
Um quilombo poderia ir desde uma pequena comunidade até milhares de pessoas.
Os quilombos se tornaram um meio eficiente de desafio e, principalmente, um avanço na luta contra a escravidão. A fuga isolada marginalizava o negro fugido, pois o medo de ser capturado e enviado de volta ao seu dono era constante. O quilombo passa a facilitar a sobrevivência de seus componentes e além dos ataques que promovia às propriedades, funcionavam como pólos de atração para outros cativos.
A resistência dos quilombolas aos senhores e às autoridades policiais mobilizadas para reprimi-los revelavam seu firme propósito de não retornarem às senzalas.
A destruição dos quilombos tornou-se uma obsessão para os senhores, lavando a organização de expedições apoiadas por milícias com a missão de aprisionar os aquilombados.
A vida no quilombo apesar de trabalhosa era também um comunidade que protegia os No interior do quilombo os negros formavam suas famílias, trabalhavam em grandes plantações agrícolas que eram em grande parte negociadas com os próprios brancos vizinhos aos quilombos ou em até mesmas pequenas aldeias próximas mantendo assim uma economia independente.
seus membros através de ataques de surpresa a engenhos como uma forma de coibir
possíveis ataques dos senhores e libertar outros negros.
A arquitetura dos quilombos e mocambos estava presente na memória, na língua e nos ombros dos negros escravizados na América portuguesa.
Na memória, pois trouxeram da África a mesma tecnologia para montar e desmontar seus acampamentos.
Na língua porque as palavras quilombo e mocambo significam respectivamente sociedade de guerreiros ou acampamento e mukambu pau de cumeeira ou viga de sustentação.
Nós ombros porque os paus de cumeeira eram levados nos ombros e serviam também como suporte para carregar outras coisas.
Literalmente o negro carregava a sua casa nas costas tais como os pigmeus no coração da áfrica.
Não havia só perseguição. Muitos quilombos se estabeleceram próximos as vilas, o que permitia um constante comércio entre as comunidades e uma aproximação mais ampla entre ambos.Temos como exemplos os quilombos que se formaram próximo a Vila Rica em minas gerais ou em Pelotas no Rio Grande do Sul em ambos as relações eram constantes entre as populações livres e escravas.
Podemos afirmar também que os quilombos, com a expansão provocada pela busca de ouro em Mato Grosso e Goiás seguiram para a fronteira, a territórios disputados por portugueses,espanhóis e índios da região. A busca de ouro para compra de alforrias fez dos quilombolas desbravadores do interior e descobridores de veios auríferos.
As comunidades quilombolas, pareciam pequenos oásis de liberdade cercados pelo deserto da sociedade escravista.

O que é Quilombo?
“Aos remanescentes das comunidades de quilombos que estejam ocupando suas terras, é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes títulos respectivos”
(art. 68 / ADCT / CF1988)

A partir do texto do artigo 68 da Constituição Federal de 1988 transcrito acima, o termo quilombo assumiu um novo significado, não mais atrelado ao conceito histórico de grupos formados por escravos fugidos. Hoje, o termo é usado para designar a situação dos segmentos negros em diferentes regiões e contextos no Brasil, fazendo referência a terras que resultaram da compra por negros libertos; da posse pacífica por ex-escravos de terras abandonadas pelos proprietários em épocas de crise econômica; da ocupação e administração das terras doadas aos santos padroeiros ou de terras entregues ou adquiridas por antigos escravos organizados em quilombos. Nesse contexto, os quilombos foram apenas um dos eventos que contribuíram para a constituição das "terras de uso comum", categoria mais ampla e sociologicamente mais relevante para descrever as comunidades que fazem uso do artigo constitucional.

A partir do Decreto nº 4.887/2003, do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi concedido a essas populações o direito à auto-atribuição como único critério para identificação das comunidades quilombolas, tendo como fundamentação a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que prevê o direito de auto-determinação dos povos indígenas e tribais.

Ainda de acordo o Decreto, que regulamenta o procedimento de regularização fundiária: “São terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos as utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural.”

Até o momento não há um consenso acerca do número preciso de comunidades quilombolas no país, mas dados oficiais vindos da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), autarquia responsável pelo processo administrativo de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos Remanescentes de Comunidades dos Quilombos, apontam que existem hoje 743 comunidades quilombolas oficialmente registradas pela Fundação Palmares, do Ministério da Cultura, e 252 processos de regularização fundiária em curso, envolvendo pelo menos 329 comunidades distribuídas em 21 estados brasileiros. A Secretaria Especial Para a Promoção da Igualdade Racial (Seppir) estima que há pelo menos três mil dessas comunidades em todo território nacional.
Fonte: http://www.koinonia.org.br/oq/a_principal.asp


A HISTÓRIA DA PRESENÇA NEGRA EM MINAS GERAIS
Comunidades Quilombolas no Brasil • Estado de Minas Gerais •
A descoberta de ouro e posteriormente de diamante provocou um intenso fluxo migratório para Minas Gerais em fins do século XVII. A promessa de enriquecimento rápido atraiu pessoas de vários lugares do Brasil. Bandeirantes paulistas, “na caça ao índio, ao ouro e às esmeraldas”, juntamente com baianos e pernambucanos migraram e trouxeram consigo um grande contingente de negros escravos (Silva, 2005: 68).
A escravidão foi a forma dominante de organização do trabalho no surgimento da sociedade mineira (Ramos, 1996). A necessidade de mão-de-obra para a exploração mineral e a ávida corrida pelo ouro durante a primeira metade do século XVIII fizeram com que o valor de um negro escravo na região fosse muito maior que no restante do país.
A demanda por trabalhadores bem como as dificuldades encontradas com o tráfico valorizaram o preço da mão-de-obra. Tal valorização estimulou proprietários de escravos de São Paulo, Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco a também migrar para as Minas, onde os negócios tornaram-se mais rendosos. O fluxo de migrantes e a grande riqueza mineral da região fizeram com que Minas Gerais se transformasse no centro do poder econômico do país durante o século XVIII.
Nos anos em que a mineração foi economicamente rendosa, foram empregados nas minas cerca de 500 mil negros (Silva, 2005: 72). Entre 1700 e 1850, época do apogeu da mineração, vieram para Minas Gerais 160 grupos de negros africanos de três regiões: os sudaneses (especialmente do Golfo da Guiné: haussas, minas, iorubas, malês, entre outros), os bantus (angolas, congos, bengueleas) e os moçambiques. Desde o século XVIII, a população negra no estado nunca foi inferior a 30% da população total – índice considerado alto (Silva, 2005).
A Resistência
Os quilombos marcaram esse período da história de Minas Gerais. A formação de quilombos foi intensa na região. Muitos foram os negros que lutaram contra o cativeiro. Segundo pesquisa realizada por Silva (2005), no período de 1710 a 1798, existiram cerca de 120 quilombos em Minas Gerais.
Os quilombos nessa região, ao contrário do que rege o imaginário popular, não se constituíram apenas em lugares ermos, distantes dos centros urbanos: “Os quilombos em Minas Gerais não existiam isolados; em geral, os escravos não fugiam para muito longe das comunidades mineradoras urbanizadas” (Ramos, 1996: 165).
Nas proximidades das vilas e cidades formaram-se numerosos pequenos quilombos, a maioria sem nome ou identificada por sua localização. Essa proximidade facilitava a fuga de outros escravos.
A repressão aos quilombos em Minas Gerais teve como primeira manifestação a criação do cargo de “capitão-do-mato”. No entanto, essa providência não controlou as fugas e a criação de sucessivos novos quilombos.
Os quilombolas ou calhambolas, como eram chamados os negros fugitivos em Minas Gerais, eram acolhidos por comerciantes que negociavam com eles (Ramos, 1996). Muitos comerciantes preferiam comprar dos quilombolas, pois o preço era mais baixo. Diversos fazendeiros também solicitavam os serviços desses negros como estratégia para que eles não se rebelassem e atacassem suas propriedades.
Por sua vez, os quilombolas precisavam vender seus produtos (cultivados, extraídos – no caso do minério – ou roubados) para garantir sua sobrevivência. Assim, a proximidade geográfica de pequenos quilombos aos centros urbanos era interessante tanto para quilombolas quanto para muitos setores da sociedade livre.
O espaço mais utilizado pelos negros para negociar seus produtos, trocar informações e estabelecer solidariedade eram as vendas. Essas vendas ou tabernas, na sua maioria, eram controladas por mulheres forras ou escravas que mantinham um estreito trato com o público. As mulheres controlavam o comércio não somente nas vendas, que ocupavam determinado espaço físico, mas também no comércio ambulante. Eram as chamadas negras do tabuleiro ou quitandeiras (Silva, 2005).
Essa condição dava às mulheres negras um papel estratégico. Mulheres forras, as quitandeiras circulavam com seus tabuleiros a vender seus produtos a escravos, livres, quilombolas e autoridades. Sempre bem informadas, elas avisavam os quilombolas sobre as investidas de repressão e facilitavam as trocas comerciais entre os negros fugidos e os demais grupos da sociedade. Além disso, elas forneciam gêneros alimentícios a escravos e os auxiliavam em suas fugas, escondendo-os em suas residências (Silva, 2005: 196).
Tal fato não passou despercebido das autoridades que chegaram a instituir leis para controlar e diminuir as atividades comerciais das mulheres negras. Como a maioria da população negra escrava na época era urbana, as várias tentativas de proibir a circulação de escravos fracassaram.
Os negros fugidos circulavam e mantinham contatos com os residentes. Como a população urbana era em grande escala composta por pessoas “de cor”, os negros fugidos circulavam de forma despercebida pelas autoridades nas cidades. Somado a esse fator, os quilombolas contavam também com o apoio da população escrava e de parcela da população livre. A relação entre quilombolas e moradores nas Minas era fluida e foi um dos fatores que dificultou sobremaneira a repressão contra esses grupos.
Foi contra o cativeiro e pela liberdade que os negros levados para Minas Gerais lutaram. Por meio de diferentes formas de resistência, os negros conquistaram seu espaço em terras mineiras. A fuga, a ocupação de áreas não povoadas após a abolição ou mesmo o recebimento de glebas de terra de seus (antigos) proprietários por doação ou herança foram as formas de conquista e consolidação dos territórios negros em Minas Gerais. Contudo, no Brasil contemporâneo, essas terras, juntamente com sua história, estão ameaçadas.

Fonte: http://www.cpisp.org.br/comunidades/html/brasil/mg/mg_historia.html

domingo, 15 de agosto de 2010

Trabalho Escravo



Texto Publicado na Revista "MUNDO e MISSÃO

Trabalho escravo envolve produtores e empresas de todo tipo e todo lugar, em vários cantos do Brasil. Casos de escravidão são noticiados em jornais nacionais e internacionais; não passa semana e mês sem novo caso... Você se lembra do caso Inocêncio de Oliveira? E as denúncias publicadas em destaque no jornal americano New York Times? A escravidão existe em quase todos os estados do Brasil. Está no Estado do Mato Grosso, que tanto exporta quanto explora mão-de-obra escrava.

Também no Pará, no Maranhão, em Tocantins, assim como no Piauí, na Paraíba, em Rondônia, na Bahia, e até em São Paulo, no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul. Os campeões? Pará, Maranhão e Mato Grosso. As vítimas da escravidão têm todas as idades: trabalhadores adultos e idosos, jovens, mulheres, crianças, adolescentes. Libertar escravos no Brasil do século 21 virou notícia comum... 115 anos após a abolição da escravatura!

Trabalho escravo: uma armadilha bem planejada

Na ponta da linha, principalmente no Nordeste, há muita pobreza; falta trabalho decente. No meio, há pensões e dormitórios onde peões aguardam hipotético empregador. O dono da pensão, a dona do hotelzinho já estão combinados com os empreiteiros: lá vem o “gato”, que paga a conta atrasada dos peões, faz promessas mirabolantes e leva o pessoal, já endividado, para a empreitada. Às vezes, o sistema já está integrado como, por exemplo, no caso do Sr. Salu, em Açailândia – MA, que é, ao mesmo tempo, “gato” e dono do Hotel Pioneiro.

Campanha contra o trabalho escravo no Brasil

“Os quarenta trabalhadores foram levados de Açailândia até Paragominas e de lá para a fazenda Vitória. Eles foram agenciados por um “gato” conhecido como Salu. Ele seria o proprietário do Hotel Pioneiro, em Açailândia, onde os trabalhadores eram alojados e contraíam as primeiras dívidas, antes mesmo de chegar ao Pará. Além do hotel, Salu também estaria usando casas alugadas para alojar os trabalhadores”. (O Liberal, 01/07/03). O “gato” é a figura central do trabalho escravo.

Atrás dele esconde-se o dono da fazenda. A região de maior aliciamento é o nordeste: dois, em cada três escravos, são do nordeste: Maranhão, Piauí, Ceará, Bahia, Alagoas; ou, de lá, já migraram para o Pará, Tocantins ou Mato Grosso. A região principal de destino é, atualmente, a nova fronteira do desmatamento, no sul do Pará: Marabá, Novo Repartimento e Terra do Meio (Iriri). A viagem começa de ônibus, passa para o caminhão, até caminhão de gado, trator, barco, a pé, e mesmo de “avionete”. Chegando, o peão não tem mais saída.

Campanha contra o trabalho escravo no Brasil

Não tem volta. Está preso. Sem precisar de capangas para vigiá-lo. A realidade é bem diferente do prometido... Alojamento, não tem; sanitários, não tem; alimentação, também não. Está tudo por fazer. Aos poucos, o trabalhador sente na carne que tudo foi mentira, que foi iludido. Começa a procurar um jeito de ir embora, mas, naquela cantina onde compra sem saber do preço, cresceu uma dívida que nem ele conhece. Tem aquela arma onipresente, ameaçadora, dissuasiva, do capanga.

Até sua própria liberdade lhe vem sendo descontada, dia após dia. No caderno de um “gato”, encontrado na fazenda Carui, no Maranhão, está escrito em todas as letras, entre arroz e sabão, entre café e querosene: compra de liberdade. E, na hora de receber, o trabalhador descobre que é ele que está devendo, é ele que paga para trabalhar. Portanto, o trabalho escravo é promessa enganosa, é trabalho forçado, em péssimas condições, sem receber... é uma dívida crescente, são ameaças, o impedimento de sair. Fugir?

Alguns poucos heróis resolvem fugir e conseguem, enfrentando barreiras, pistoleiros, sede e fome. Um ou outro desses fugitivos chega para informar e denunciar a situação de quem ficou lá, preso.

Alguns depoimentos

[...] os trabalhadores gostariam de sair da fazenda, são impedidos porque, segundo o fazendeiro, ainda há dívida dos trabalhadores para com ele.

[...] Na hora do acerto, o proprietário não quis acertar com o “gato” e nem com os trabalhadores, mandando-os procurar seus direitos... Foram soltos em Sedero II, onde estão desde o último sábado, passando fome e sem alternativas de receber seus direitos.

[...] No final do mês o “gato” desconta os valores da alimentação que geralmente são cobrados acima do valor de mercado, assim os trabalhadores sempre estão em dívida; até o momento só receberam uma quantia de R$ 40,00 em dinheiro.

[...] Que quando foi para a fazenda, foi com uma dívida ao “gato”, que lhe pagou suas despesas de hospedagens, que lá tem uma cantina onde os preços são bastante elevados... o “gato” Salu é muito valente e tem sempre consigo uma arma calibre 20, e um outro senhor conhecido por Benedito fica durante todo o dia vigiando os trabalhadores.

(...) o nosso trabalho é de roçar o pasto e bater veneno nos tocos. Vários de nós têm sentido dor de cabeça e vômito por causa do veneno que é muito forte... O capataz nos fala que o veneno não faz mal. Nós precisamos e queremos trabalhar, mas estamos com medo de adoecer devido ao veneno. Por isso, queremos sair da fazenda recebendo os nossos direitos e estamos com medo que a fazenda não vai acertar corretamente e nem nos deixar sair antes de 3 meses.

[...] Estamos arranchados em barracos de lona preta com lama dentro porque fica perto de uma represa, onde os gados bebem e nós também usamos essa mesma água pra tudo. A alimentação, além de ser só arroz e feijão, ainda é pouca; no nosso barraco é apenas 1 kg de feijão para 16 trabalhadores.

Em 9 anos, 10.700 escravos libertados pelo Grupo Móvel (GM):
um combate inútil?

Para apurar as denúncias, o Governo criou, em 1995, o Grupo Móvel de Fiscalização. Suas características lhe garantem independência, isenção, qualificação. Seus membros são voluntários. Reúne voluntários entre fiscais do trabalho, policiais federais, procuradores, fiscais do Ibama, etc. Sua função é apurar as denúncias e resgatar os trabalhadores do cativeiro. Opera em condições difíceis, perigosas. Sempre “no limite”. Seus objetivos são: libertar os trabalhadores, pagar-lhes o que lhes foi sonegado, calcular valores a receber, pressionar o patrão a pagar na hora. E, aproveitando, expedir a Carteira de Trabalho que, para muitos, é o primeiro documento de identidade de sua vida, o primeiro sinal de reconquista da cidadania.

Nota triste

Chegando em casa, ou de volta à pensão, o peão libertado está feliz da vida. Cheio da grana, faz farra por duas noites... e, logo mais, volta para outra empreitada. É que, sem alternativa à vítima, nem punição aos escravizadores, a escravidão só tende a crescer, a explodir. Onde? Principalmente na pecuária e no desmatamento que a precede. Onde? Pela ordem: no Pará, no Mato Grosso, no Maranhão. E, de forma mais esporádica, também em outros estados, onde pode ser simplesmente desconhecida.

Por isso, apesar dessa aparente eficiência, verifica-se a insuficiência de uma ação puramente fiscalizadora. Tirar da escravidão não é erradicar o trabalho escravo como sistema, alimentado, de forma complexa, por tantos fatores. A fraqueza do combate ao trabalho escravo tem incentivado a ousadia dos infratores, tais como: abandonar fiscais e peões no meio do mato, desafiar publicamente as autoridades federais, mandar assaltar os carros da Polícia Federal que apóia o Grupo Móvel (como ocorreu no ano passado!).

Ou publicar, no jornal local, aviso de abandono de emprego, visando aqueles que fugiram da fazenda para denunciar a Carteira de Trabalho nunca assinada, mas seqüestrada. (Fonte: relatórios de fiscalização da Secretária da Inspeção do Trabalho (SIT) – Grupo Móvel, 1996-2003)

No âmago da questão: cobiça e impunidade...

A opção preferencial pelo agronegócio vai continuar a ser paga com florestas... e trabalho escravo! (Marcelo Leite, editor de Ciência da Folha de São Paulo, em 11.04.04). Aqui vai um exemplo emblemático de impunidade: o Sr. Quagliato, pecuarista no sul do Pará, dono de 13 fazendas e de 250.000 cabeças de gado, líder mundial em questões de inseminação artificial, já denunciado oito vezes por trabalho escravo, mais a nona neste ano... e nunca condenado! Recente relatório de experts da Organização Internacional do Trabalho (OIT) constata que, apesar de tantos peões resgatados nos últimos 7 anos (mais de 5.000), não se tem registro de mais que duas condenações penais de proprietários e quatro de empreiteiros.... E qual a condenação? Entregar cestas básicas à vizinhança!

De onde vem tamanha impunidade?

Muitas vezes, vem de juízes omissos no dever de julgar com justiça os autores desses graves delitos, apesar das provas apresentadas pelo Ministério Público do Trabalho. Outras vezes, vem da Justiça do Trabalho que, até a criação das Varas itinerantes, em 2002, esteve praticamente ausente no sul do Pará. Resumindo a situação que tem prevalecido: à justiça comum não interessa, à Justiça Federal não compete, à Justiça do Trabalho? Não há Justiça do Trabalho! Então, é fácil imaginar o resultado...

Nada de estranho, portanto, neste ranking:

De 10 infratores reincidentes, identificados nas denúncias colhidas nos primeiros 8 meses de 2002, um é reincidente pela décima vez (Jairo Andrade), outro pela nona vez (Quagliato), outros pela sexta ou sétima vez, chegando à média absurda de quase cinco reincidências... sem processos. Por isso, é urgente a mudança e muita coisa deve mudar ainda. Já existe amplo consenso sobre as principais mudanças: competência federal, pois o crime de escravidão fere direitos humanos fundamentais; confisco da terra; multas reforçadas; interiorização da Justiça do Trabalho; melhor conceituação legal do trabalho escravo.

Avanços

A partir de 2002, a mobilização contra o trabalho escravo aumentou bastante. E tem havido avanços concretos. Já se constataram progressos na mobilização e articulação das instituições competentes para o combate ao trabalho escravo: Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal, Justiça do Trabalho, OIT, etc. Veja os exemplos: Dezembro de 2002: o Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, ao julgar um processo relativo a trabalho escravo, conclui, por unanimidade, pela competência da Justiça Federal.

Com a decisão, ficou mantido o decreto de prisão contra Joaquim Montes. O fazendeiro foi denunciado pelo Ministério Público Federal pela prática de vários crimes, entre eles formação de quadrilha, homicídio e submissão de pessoas à condição análoga a de escravo. Novembro de 2002: Juiz do Trabalho condenou ao pagamento de indenização por danos coletivos. Dezembro de 2002: o Juiz do Trabalho decretou o bloqueio das contas de fazendeiro que se negava a pagar os direitos dos trabalhadores....

O Juiz bloqueia conta de fazendeiro acusado no sul do Pará e 95 trabalhadores foram libertados. Em 2003: foi planejada uma ação mais integrada entre Grupo Móvel, Polícia Federal, Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal. Doravante será possível ver a situação in loco e tomar as previdências cabíveis. Leia as palavras do Juiz Sérgio Polastro: “(...) Muitos trabalham doentes, com malária, dengue e problemas renais. Alguns deles também se acidentam em serviço.

Um trabalhador, em especial, chamou a atenção pela gravidade do problema. Um pedaço de madeira atingiu seu olho esquerdo. O “gato” não permitiu que ele procurasse cuidados médicos. Como o inchaço do olho estava impedindo o bom andamento do serviço, o trabalhador foi liberado. Hoje está cego de forma irreversível, sem qualquer amparo previdenciário. Somente quando chegamos aqui e olhamos nos olhos desses trabalhadores e de suas famílias, que estão acostumados a sofrer as piores humilhações sem reclamar, como se isso fizesse parte de suas infelizes existências, é que compreendemos a real dimensão e importância deste trabalho”.

As soluções propostas

Em 2002, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e o Conselho do Direito de Defesa da Pessoa Humana (CDDPH) elaboraram propostas concretas para acabar com a escravidão.

1) soluções estruturais:

– agilizar políticas de geração de emprego e renda, reforma agrária e qualificação, especialmente nas regiões de origem;

– alertar e mobilizar os trabalhadores expostos para se prevenirem e lutarem por terra e emprego.

2) ações imediatas:

– ampliar drasticamente a ação do Grupo Móvel, contratar novos fiscais e integrar melhor os vários componentes, para:

* julgar efetivamente os culpados, levar a Justiça até as vítimas (mais Varas itinerantes) e denunciar sistematicamente os infratores;
* aplicar sanções econômicas radicais e imediatas: multas reforçadas, indenizações pesadas, corte de financiamentos e confisco da terra;
* determinar a competência federal, com rito acelerado e melhor tipificação do crime de trabalho escravo.

Há anos, a OIT vinha cobrando do Brasil alguma solução. Mesmo enfrentando ameaças de morte, fiscais, juízes, procuradores, agentes da CPT e do CDDPH assumiram a campanha contra o trabalho escravo. O Brasil começa a acordar à vergonhosa realidade do trabalho escravo.

Com a palavra
Dom Tomás Balduíno
Presidente da CPT – Comissão Pastoral da Terra

Em 27 de abril de 2004, Dom Balduíno foi convidado a depor sobre problemas da terra no Brasil e deste depoimento salientamos os trechos mais importantes

oje estou aqui na qualidade de bispo, presidente da Comissão Pastoral da Terra, para dar testemunho do que vi e vivi durante estes 27 anos que já se vão desde 1977. A CPT foi criada, em 1975, para tratar dos problemas da Amazônia diante do avanço das grandes empresas agropecuárias, incentivadas pela Sudam. A Igreja buscava diferentes formas de atuação junto aos trabalhadores da terra, sobretudo, os posseiros, índios e peões, para que eles pudessem melhor defender seus direitos e se tornarem sujeitos e protagonistas de sua própria história.

Logo se deu conta que, em todo o Brasil, os trabalhadores e trabalhadoras da terra viviam graves situações de conflito, estavam submetidos a diversas formas de repressão e, por isto, a CPT estendeu sua ação para todos os lados, onde o clamor dos pobres do campo se fazia ouvir. A violência, que saltava aos olhos, começou a ser registrada sistematicamente já no final dos anos 70. A CPT criou um Setor de Documentação encarregado de recolher e organizar os dados dos conflitos contra os trabalhadores e trabalhadoras na sua luta pela conquista da terra e para poderem resistir e sobreviver na terra.

Desde 1985, estes dados começaram a ser publicados anualmente em forma de cadernos e a CPT tornou-se a única entidade a realizar tão ampla pesquisa da questão agrária em escala nacional. Não venho aqui para apresentar os frios números das estatísticas da violência. Há gente que pode fazer isto com muito mais competência do que eu. Estou aqui, como pastor, para, como disse antes, dar testemunho do que vi e vivi nestes anos. Para falar das histórias de dor, sofrimento, angústia e desespero de milhares e milhares de famílias na imensidão do território nacional por causa da violência que sofreram.

Algumas perderam seus membros, parentes ou amigos. Outras perderam tudo o que haviam conseguido construir ao longo de muitos anos. A crueza dos números esconde e encobre a aflição e os gritos de horror que a violência provocou. Aqui estou para testemunhar também a determinação e a força de vontade de centenas de milhares de brasileiros que lutam por dignidade e justiça, determinação que os fez enfrentar um sem número de obstáculos, afrontar pistoleiros e jagunços, quando não, corruptas autoridades.

Venho, pois, testemunhar a alegria e a celebração de muitas conquistas e vitórias, a cidadania que se forja nos inúmeros acampamentos deste Brasil e que está fazendo germinar uma nova consciência pátria”. A seguir, Dom Balduíno enumera situações de violência que acontecem no campo, registradas a partir da 1985: as numerosas mortes em todos estes anos, entre as quais a do sindicalista Nativo da Natividade; a do padre Josimo que, depois de anos de ameaças, foi assassinado em 10 de maio de 1986, no então estado de Goiás, hoje Tocantins; os massacres de Corumbiara, quando centenas de famílias ocuparam a Fazenda Santa Elina, na busca de um direito que a estrutura fundiária brasileira sempre lhes negara.

Foram nove os trabalhadores mortos. Em 1996, houve o massacre de Eldorado do Carajás, no Pará, com o número de mortos ainda hoje indeterminado. O padre Francisco Cavazzoni, conhecido como padre Chico, foi alvejado por dar apoio a posseiros e lavradores pobres. Está completamente cego, mas continua a luta pelos direitos dos pobres.

Dom Balduíno ainda cita as dificuldades para se chegar à paz e à concórdia no campo e enumera as seguintes causas:

– A ação do judiciário contra os camponeses e a favor do latifúndio: “Preciso testemunhar outra forma de violência, a do próprio Judiciário que, para proteger o latifúndio agride os trabalhadores, massacra-os, humilha-os e os deixa em situações de extrema dificuldade e de miséria. O que estas agressões, entretanto, não conseguem destruir são os sonhos e a esperança dos pobres da terra”.

– Os assassinatos no campo, entre 1985 e 2003: “Um número que causa espanto: 1349 pessoas assassinadas, em 1003 ocorrências diferentes. Mas o que mais causa espanto é a impunidade dos crimes que se cometem contra os trabalhadores. Só 75 destas 1003 ocorrências, até hoje, foram julgadas. Nestes 75 julgamentos, 64 executores foram condenados e 44 absolvidos. Já quando olhamos para o quadro dos mandantes, os números são mais dramáticos. Só 15 mandantes condenados, 6 absolvidos. A impunidade se torna a grande incentivadora e promotora dos crimes contra os trabalhadores do campo”.

– O tratamento desigual da justiça entre donos e posseiros.

– A impunidade.

O trabalho escravo

“Outra realidade que tenho acompanhado de perto é com relação ao trabalho escravo. A CPT, durante muitos anos, foi a instituição que quase solitariamente veio denunciando, a cada ano, a ocorrência do trabalho escravo no campo. Esta realidade, que hoje ganhou grande espaço na mídia e está merecendo a atenção dos órgãos do governo, por muito tempo teimou em não aparecer diante da opinião pública.

(...) Meu companheiro e irmão, dom Pedro Casaldáliga, bispo de São Félix do Araguaia, no Mato Grosso, foi um dos primeiros a denunciar o que acontecia, já na década de 70, nas novas frentes de expansão do capitalismo com os incentivos fiscais da Sudam. A CPT é herdeira deste trabalho e, por sua atuação, mereceu reconhecimento internacional”.

(...) “A partir de 1997, a CPT desencadeou uma Campanha sistemática de Combate ao Trabalho Escravo. Essa Campanha recolhe informações sobre as ocorrências de Trabalho Escravo e as denúncias, e esclarece os trabalhadores sobre os riscos que correm ao serem contratados, por meio dos chamados “gatos”, para serviços sub-empreitados por empregadores inescrupulosos, e sobre como devem agir caso venham a se encontrar em condições de “escravidão”.

Apesar da intensificação do trabalho de fiscalização do Grupo Móvel do Ministério do Trabalho esta prática perdura, sobretudo, nas áreas onde ainda acontece um desmatamento mais intenso, com destaque para os estados do Pará e Mato Grosso. Estas denúncias têm acarretado sérias ameaças de morte contra o trabalhador rural Jair Matos, os agentes da CPT do Tocantins, Edmundo Rodrigues, Silvano Rezende e Fr. Xavier Plassat. As ameaças atingiram também Dr. Mário Lúcio de Avelar, Procurador da República em Palmas (TO), e o Dr. Jorge Vieira, Juiz do Trabalho em Parauapebas (PA), por sua atuação firme diante destes crimes.

A exploração da mão-de-obra em condições análogas ao trabalho escravo envolve inclusive políticos, como têm comprovado as ações de fiscalização do Ministério do Trabalho, e a mídia tem noticiado. Os nomes do deputado Inocêncio de Oliveira, do presidente da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, Jorge Picciani, e, neste ano, o do Senador João Ribeiro aparecem como envolvidos nesta prática, flagrada em suas propriedades. Por que será que o projeto de lei que prevê o confisco das terras onde se flagre o trabalho escravo ainda encontra fortes resistências aqui?” Entre outras causas que fomentam o trabalho escravo, dom Balduíno cita a grilagem de terras, as terras vendidas aos estrangeiros, a privatização das águas e o agronegócio.

CONCLUSÃO

“Minha conclusão é de uma grande esperança no futuro do nosso país a partir da caminhada do povo da terra. Este tem sido o nosso aprendizado de CPT. Comparando os agentes desta pastoral com os demais agentes de outras pastorais, sem desmerecer destes, talvez nós sejamos o grupo mais motivado e com mais visão de um horizonte positivo e de esperança para o Brasil a partir do que constatamos entre os homens e mulheres da terra.

Vou repetir resumidamente aqui o que já tenho dito em outros ambientes e o que aprendemos deste admirável povo. É que a terra é mais do que terra. A terra não cai jamais dos grandes e ricos para os pequenos e pobres. Nem do governo para os sem-terra, como caiu o maná no deserto. A terra, que é dom de Deus, é acima de tudo fruto de conquista e esta se dá na luta.

(...) Terra não é apenas o pedaço de chão da sobrevivência, ela é símbolo da busca da Justiça e do Direito, ela é essencialmente o lugar da gratuidade na igualdade de todos os comensais dos seus frutos, como numa grande mesa da abundância. Terra é participação política no caminho da verdadeira democracia e na busca inarredável das mudanças que trazem realmente a libertação do povo, a começar dos mais pobres. Terra é cidadania, é dignidade. Terra é a partilha do chão para a partilha do pão, na comunhão da festa, da dança, da beleza, da Páscoa!”.

rabalho infantil gera lucro pra quem explora, pobreza pra quem é explorado, faz parte da cultura econômica brasileira e está diretamente ligado ao trabalho escravo. A quem incomoda a luta contra o trabalho infantil? Incomoda aos que se incomodam com a luta contra o trabalho escravo. Incomoda aos que se incomodam com a luta contra o trabalho degradante. O combate ao trabalho infantil incomoda a quem lucra com o trabalho infantil, a quem lucra com o trabalho escravo e a quem lucra com o trabalho degradante.

A quem incomoda a dignidade humana; a quem incomoda a beleza, a resistência, a sensualidade, a honestidade, a capacidade de organização do pobre; a quem incomoda a imagem bonita dos menos favorecidos? A quem incomoda a denúncia das injustiças da pobreza? Incomoda aos ricos e incomoda a uma parcela da classe média. Pra existir um rico quantos pobres tem que existir? Me perguntou um dia um carvoeiro, cansado de trabalhar, desde criança.

Ataliba dos Santos estava cansado de não assinar a carteira, não estudar, cansado de nãos... E cansado de não ter respostas. Enquanto fotografava pensava a quem interessa o desequilíbrio social? No Brasil, o trabalho infantil não é conseqüência da pobreza, mas sim instrumento financiador dela. Empregar crianças significa lucro fácil. A exploração infantil gera o desemprego dos pais, trabalho escravo, crianças doentes, subnutridas, morando em precárias condições, prejudicadas na sua capacidade intelectual e no seu direito à educação, lesadas no seu direito ao lazer, ao carinho, à alegria; sem infância.

“A gente custa muito pra entender que nasceu pra ser peixe de engordar gato que engorda rico e, em casa, a gente fabrica com todo amor os próximos peixinhos. Pra fugir disso, botei todo mundo pra estudar, mas sinto um aperto no peito porque sei que o ensino é muito ruim. Filho de pobre, mesmo depois de estudar um, dois, quatro anos, continua analfabeto. “As palavras de José dos Santos, carvoeiro na região do serrado, em minas Gerais expressão a luta para mudar uma realidade.

José dos Santos está tentando romper uma corrente perversa que alimenta uma cadeia de trabalho degradante nas carvoarias brasileiras, assim como nos sisais, nas fazendas, nos canaviais, nas pedreiras e em vários setores do segmento rural que alimentam indústrias urbanas. O trabalhador que vive em trabalho degradante ou análogo a escravo, é, na sua imensa maioria, analfabeto, e foi explorado como trabalhador infantil. Aconteceu assim com seus pais e seus avós. O caminho normal é acontecer com os filhos e netos.

Infelizmente, ainda não existe no Brasil uma política social que faça a associação entre trabalho infantil e trabalho degradante, análogo a escravo ou escravo, de forma a romper esse círculo. A realidade é que o trabalhador escravo de hoje foi o trabalhador infantil de ontem. A realidade do trabalho nas carvoarias brasileiras merece uma análise diferenciada. Muitas vezes o trabalho não é considerado trabalho escravo, outras vezes sim.

Porém, sempre é um trabalho extremamente pesado e quase sempre, mesmo em casos de carteira assinada, um trabalho degradante. Acaba com a saúde do trabalhador. Muitas vezes, olhar uma carvoaria em pleno vapor é, do ponto de vista humanitário, algo inaceitável.

Câmara dos Deputados está prestes a votar uma das mais importantes Emendas Constitucionais deste ano. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 438, que confisca a propriedade rural em que for encontrado trabalho escravo, será fundamental para contribuir com a erradicação desta prática no país. Milhares de brasileiros são obrigados a trabalhar em condições desumanas, roubados de sua dignidade e de sua liberdade, enquanto alguns poucos empresários lucram com a exploração dessa mão-de-obra. Com isso, cometem um crime contra os direitos humanos e, ao mesmo tempo, mancham a imagem do Brasil no exterior. A Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRAE) enumerou as mentiras mais contadas por aqueles que não querem ver o problema resolvido e contou a verdade por trás delas.

Mentiras:

1. Não existe trabalho escravo no Brasil.
2. A escravidão foi extinta em 13 de maio de 1888.
3. Se o problema existe, é pequeno. Além disso, apenas uma meia dúzia de fazendeiros utiliza trabalho escravo.
4. A lei não explica detalhadamente o que é trabalho escravo. Com isso, o empresário não sabe o que é proibido fazer.
5. A culpa não é do fazendeiro e sim de “gatos”, gerentes e prepostos. O empresário não sabe dos fatos que ocorrem dentro de sua fazenda e por isso não pode ser responsabilizado.
6. O trabalho escravo urbano é do mesmo tamanho que o trabalho rural.
7. Já existem muitas punições para quem pratica trabalho escravo. É só fazer cumprir a lei que a questão está resolvida. Não é necessária a aprovação de uma lei de confisco de terras.
8. A Justiça já tem muitos instrumentos para combater o trabalho escravo, não é necessário criar mais um.
9. Esse tipo de relação de trabalho já faz parte da cultura da região.
10. Não é possível aplicar a legislação trabalhista na região de fronteira agrícola amazônica. Isso geraria desemprego.
11. A fiscalização abusa do poder e é guiada por um viés ideológico. A Polícia Federal entra armada nas fazendas.
12. A divulgação internacional prejudica o comércio exterior e vai trazer prejuízo ao país.
13. A imprensa prejudica a imagem de estados como Pará, Mato Grosso,Tocantins, Maranhão, Rio de Janeiro e Bahia, entre outros, ao mostrar que há propriedades com trabalho escravo.
14. O Estado está ausente da região de fronteira agrícola e só aparece para punir quem está desenvolvendo o país.

Comentário sobre algumas:

1) Mentira: Não existe trabalho escravo no Brasil.

Verdade: Infelizmente, existe. A assinatura da Lei Áurea, em 1888, representou o fim do direito de propriedade de uma pessoa sobre a outra, colocando fim à possibilidade de possuir legalmente um escravo. No entanto, persistem situações que mantêm o trabalhador sem possibilidade de se desligar de seus patrões. Há fazendeiros que, para realizar derrubadas de matas nativas para formação de pastos, produzir carvão para a indústria siderúrgica, preparar o solo para plantio de sementes, entre outras atividades agropecuárias, contratam mão-de-obra utilizando os famigerados “gatos”.

Eles aliciam os trabalhadores, servindo de fachada para que os fazendeiros não sejam responsabilizados pelo crime. Esses “gatos” recrutam trabalhadores em regiões distantes do local da prestação de serviços ou em pensões localizadas nas cidades próximas. Na primeira abordagem, eles se mostram pessoas extremamente agradáveis, portadores de excelentes oportunidades de trabalho. Oferecem serviço em fazendas, com salário alto e garantido, boas condições de alojamento e comida farta.

Para seduzir o trabalhador, oferecem “adiantamentos” para a família e garantia de transporte gratuito até o local de trabalho. O transporte é realizado por ônibus em péssimas condições de conservação ou por caminhões improvisados sem qualquer segurança. Ao chegarem ao local de trabalho, eles são surpreendidos com situações completamente diferentes das prometidas. Para começar, o “gato” lhes informa que já estão devendo.

O adiantamento, o transporte e as despesas com alimentação na viagem já foram anotados no caderno de dívida do trabalhador que ficará de posse do “gato”. Além disso, o trabalhador percebe que o custo de todos os instrumentos que precisar para o trabalho – foices, facões, motosserras, entre outros – também serão anotados no caderno de dívidas, bem como botas, luvas, chapéus e roupas.

Finalmente, despesas com os emporcalhados e improvisados alojamentos e com a precária alimentação serão anotados, tudo a preço muito acima dos praticados no comércio.

4) Mentira: A lei não explica detalhadamente o que é trabalho escravo. Com isso, o empresário não sabe o que é proibido fazer.

Verdade: O artigo n.º 149 do Código Penal (que trata do crime do trabalho escravo) existe desde o início do século passado. A legislação trabalhista aplicada no meio rural é da década de 70 (lei n.º 5.889). Portanto, tanto a existência do crime como a obrigação de garantir os direitos trabalhistas não são coisas novas. Os proprietários rurais que costumeiramente exploram o trabalho escravo, na maioria das vezes, são pessoas instruídas que vivem nos grandes centros urbanos do país, possuindo excelente assessoria contábil e jurídica para suas fazendas e empresas.

Além disso, uma série de acordos e convenções internacionais tratam da escravidão contemporânea. Por exemplo, as convenções internacionais de 1926 e a de 1956, que proíbem a servidão por dívida, entraram em vigor no Brasil em 1966. Essas convenções estão incorporadas à legislação nacional. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) trata do tema nas convenções número 29, de 1930, e 105, de 1957. Há também a Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais do Trabalho e seu Seguimento, de 1998.

De acordo com o Relatório Global da OIT de 2001, as diversas modalidades de trabalho forçado no mundo têm sempre em comum duas características: o uso da coação e a negação da liberdade. No Brasil, o trabalho escravo resulta da soma do trabalho degradante com a privação de liberdade. O trabalhador fica preso a uma dívida, tem seus documentos retidos, é levado a um local isolado geograficamente que impede o seu retorno para casa ou não pode sair de lá, impedido por seguranças armados. A Organização utiliza, no Brasil, o termo “trabalho escravo” em seus documentos.

5) Mentira: A culpa não é do fazendeiro e sim de “gatos”, gerentes e prepostos. O empresário não sabe dos fatos que ocorrem dentro de sua fazenda e, por isso, não pode ser responsabilizado.

Verdade: O empresário é o responsável legal por todas as relações trabalhistas de seu negócio. A Constituição Federal de 1988 condiciona a posse da propriedade rural ao cumprimento de sua função social, sendo de obrigação de seu proprietário tudo o que ocorrer nos domínios da fazenda. Por isso, o fazendeiro tem o dever de acompanhar com freqüência a ação dos funcionários que administram sua fazenda para verificar se eles estão descumprindo alguma norma da legislação trabalhista, além de orientá-los no sentido de contratar trabalhadores de acordo com as normas estabelecidas pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).

6) Mentira: A Justiça já tem muitos instrumentos para combater o trabalho escravo; não é necessário criar mais um.

Verdade: Erra quem pensa que trabalho escravo é um problema apenas trabalhista. Trabalho escravo é um crime de violação de direitos humanos. Normalmente, quem se utiliza dessa prática também é flagrado por outros crimes e contravenções. Dessa forma, o trabalho escravo torna-se um tema transversal, que está ligado a diversas áreas e por todas deve ser combatido. A própria Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) é intersetorial, envolvendo diversas instituições estatais e da sociedade civil.

Trabalho escravo também é um problema de desrespeito aos direitos humanos (tortura, maus tratos), criminal (cerceamento de liberdade, espancamentos, assassinatos) e previdenciário. Todos sabem que a PEC, quando aprovada, não vai resolver sozinha o problema do trabalho escravo. Para isso, é necessário também gerar empregos, conceder crédito agrícola, melhorar as condições de vida dos trabalhadores, atuando de forma preventiva nos locais de aliciamento para que eles não precisem migrar em busca de um emprego em local distante e desconhecido. Mas a nova lei vai se somar aos instrumentos já existentes para erradicar o problema.

Emenda Constitucional

por Pedro Miskalo

A proposta é louvável. Isto resolve?

Senado Federal enviou recentemente à Câmara dos Deputados uma Proposta de Emenda à Constituição para “dispor sobre o confisco do imóvel rural em que for constatada a exploração de trabalho escravo, revertendo a área para o assentamento dos trabalhadores que estavam sendo explorados no local” (PEC 438/01). O mesmo documento solicita o confisco de “todos os bens de valor econômico apreendidos em decorrência da exploração do trabalho escravo”.

E acrescenta:

“Em ambos os casos a expropriação prescindirá de qualquer indenização ao expropriado”. A proposta 438/01 foi aprovada, em 12 de maio, pela comissão especial da Câmara dos Deputados. Não havia sido levada a plenário quando este texto foi escrito. Mas os membros da comissão garantem sua aprovação em plenário e sua posterior promulgação.

O presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Vantuil Abdala, que acompanhou os trabalhos da comissão, afirmou:

“A aprovação da emenda é uma demonstração que a sociedade está reagindo a esta situação, dando um instrumento muito mais efetivo para o Judiciário erradicar a prática do trabalho escravo”.

“Acabar com a escravidão não basta;
é preciso destruir a obra da escravidão” (Joaquim Nabuco)

A abolição da escravidão no Brasil aconteceu sem a democratização da terra e pouco ou nada se fez para que a liberdade jurídica do escravo o conduzisse às demais liberdades e conquistas da cidadania. Eis porque a discussão é candente e o problema está longe de ser resolvido. Sua abrangência é tão grande como extensas são as fronteiras geográficas de nosso país. De fato, a exploração do trabalho humano persiste, desde abafados centros fabris espalhados pelas metrópoles, até os limites das fronteiras agrícolas, onde as condições de vida são mais degradantes.

A servidão por dívida é a principal forma de escravização dos trabalhadores. Nesse sistema, os trabalhadores são ardilosamente levados a tomar empréstimos para custear remédios, alimentação, transporte, habitação... O débito é pago com longas jornadas de trabalho, mas nunca suficientes para quitá-lo. Passam a ser, então, propriedade perene do empregador, que os desumanizam e controlam seus movimentos.

A servidão por dívida é uma praga difícil de ser arrancada em nosso país devido a alguns agravantes que asseguram a impunidade:

o isolamento e as dificuldades de acesso às propriedades rurais, a dispersão populacional, a pobreza crônica, a ausência do Estado, o baixo nível de organização sindical, o desemprego, a desinformação. A consciência da degradação foi lentamente despertando e mobilizando as entidades que defendem os direitos humanos, como, por exemplo, a Comissão Pastoral da Terra e outras, criadas para sensibilizar e condenar o Estado brasileiro a indenizar as vítimas da escravidão.

Quando o Governo se despertou para a gravidade do problema, elaborou um Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, buscando construir uma política pública permanente, dedicada à repressão do trabalho escravo. Uma de suas metas é a alteração da Constituição, cujas lacunas favorecem a impunidade. A segunda abolição só vai acontecer com a mobilização de todas as forças sociais e políticas. Sem a união da sociedade inteira, os indivíduos desumanos, muitas vezes na pele de produtores rurais, continuarão a explorar a miséria alheia.

domingo, 8 de agosto de 2010

Camisas Negras - Luta contra o racismo

A EXTINÇÃO DO RACISMO NO FUTEBOL

É COM GRANDE PRAZER E EMOÇÃO QUE COLOCO ESTE TEXTO PARA QUE TODOS VEJAM A IMPORTÂNCIA QUE TEM A HONRA E NÃO A COR.
PARABÉNS AO CLUB DE REGATAS VASCO DA GAMA.
ASSISTAM AO VIDEO
Este texto foi compilado de uma série de crônicas publicadas em 1974 pelo Jornal dos Sports, na coluna Uma Pedrinha na Chuteira, assinada pelo Zé de São Januário (pseudônimo do jornalista Álvaro do Nascimento).
Em 1923, uma equipe considerada pequena, que acabara de ser promovida a primeira divisão, conquistou o campeonato carioca. Como se isso não bastasse para provocar a ira dos aristocráticos clubes grandes, o campeão era formado por trabalhadores de origem humilde, brancos, negros e mulatos, sem dinheiro nem posição social. Este campeão era o Vasco da Gama.
Naquela época, o racismo imperava no futebol brasileiro. Em 1921, era debatido se jogadores de cor deveriam ser convocados para os importantíssimos confrontos entre a seleção brasileira e a da Argentina.
Como vingar-se do atrevimento do Vasco? Os clubes aristocratas reuniram-se e deliberaram excluir jogadores humildes, sob a alegação de que praticavam o profissionalismo.
Numa sessão realizada na sede da Liga Metropolitana, Mário Polo, o presidente do Fluminense, apresentou as condições impostas aos chamados pequenos clubes. Estes teriam que apresentar condições materiais e técnicas e eliminar de seus quadros sociais jogadores considerados profissionais, constantes de uma lista que foi lida no momento.
A confusão e as vaias explodiram no recinto ao término da exposição feita por Mário Polo.
Finalmente usou da palavra Barbosa Junior, do S.C. Mackenzie, representante dos chamados pequenos clubes, condenando o racismo dos grandes clubes, uma vez que os jogadores atingidos eram apenas os mulatinhos rosados do Vasco, Bangu, Andaraí e São Cristóvão, sendo o Vasco o mais prejudicado de todos. Os arianos do Fluminense, Botafogo, Flamengo e América nem de leve foram tocados.
Os aplausos calorosos da enorme assistência a Barbosa Junior deixaram a Mário Polo desapontado. A confusão foi de tal ordem que a sessão foi suspensa por dez minutos, durante os quais Mário Polo e Ari Franco, o representante do Bangu, retiraram-se juntos para uma das salas onde conversaram secretamente.
Vendo seus planos irem por água abaixo, os clubes grandes decidiram que se afastariam da Liga Metropolitana, formando uma nova entidade, a Associação Metropolitana de Esportes Atléticos. Estava decretada a cisão do futebol carioca.
Mário Polo e seus comparsas calculavam que os chamados pequenos clubes ingressariam cabisbaixos e humilhados na nova entidade, submetendo-se às suas regras discriminatórias. Bangu e São Cristóvão, que possuíam jogadores atingidos pelo racismo, confirmaram as expectativas dos grandes. Os demais fatalmente seguiriam essa opção, não fora a atitude desassombrada do presidente vascaíno Dr. José Augusto Prestes e da diretoria do Vasco, enfrentando com galhardia a campanha racista, apoiado pelos outros pequenos clubes.
Um ofício assinado pelo presidente do Vasco foi enviado a Arnaldo Guinle, presidente da AMEA, declarando publicamente que negava-se a participar da nova entidade. Esse documento histórico, transcrito abaixo, deu origem a extinção do racismo no futebol.
Eis o teor do ofício:
Rio de Janeiro, 7 de abril de 1924
Ofício no. 261
Exmo. Sr. Arnaldo Guinle, M.D. presidente da Associação Metropolitana de Esportes Athleticos.
As resoluções divulgadas hoje pela imprensa, tomadas em reunião de ontem pelos altos poderes da Associação a que V. Exa. tão dignamente preside, colocam o Club de Regatas Vasco da Gama em tal situação de inferioridade que absolutamente não pode ser justificada nem pela deficiência do nosso campo, nem pela simplicidade da nossa sede, nem pela condição modesta de grande número dos nossos associados.
Os privilégios concedidos aos cinco clubes fundadores da AMEA e a forma como será exercido o direito de discussão e voto, e as futuras classificações, obriga-nos a lavrar o nosso protesto contra as citadas resoluções.
Quanto a condição de eliminarmos doze (12) jogadores das nossas equipes, resolve por unanimidade a diretoria do Club de Regatas Vasco da Gama, não a dever aceitar, por não se conformar com o processo por que foi feita a investigação das posições sociais desses nossos con-sócios, investigações levadas a um tribunal onde não tiveram nem representação nem defesa.
Estamos certos que V. Exa. será o primeiro a reconhecer que seria um ato pouco digno da nossa parte sacrificar ao desejo de filiar-se a AMEA alguns dos que lutaram para que tivéssemos entre outras vitórias a do Campeonato de Futebol da Cidade do Rio de Janeiro de 1923.
São esses doze jogadores jovens quase todos brasileiros no começo de sua carreira, e o ato público que os pode macular nunca será praticado com a solidariedade dos que dirigem a casa que os acolheu nem sob o pavilhão que eles com tanta galhardia cobriram de glórias.
Nestes termos, sentimos ter de comunicar a V. Exa. que desistimos de fazer parte da AMEA.
Queira V. Exa. aceitar os protestos de consideração e estima de quem tem a honra de se subscrever de V. Exa. Att. Obrigado.
Dr. José Augusto Prestes
Presidente
Este ofício do C. R. Vasco da Gama esclarece com precisão os motivos que levaram o hoje poderoso clube de Sao Januário a afastar-se dos chamados grandes clubes, ficando ao lado dos pequenos. Isso deu ao Vasco a maior popularidade e admiração já alcançada, até aquela época, por clubes desportivos do Rio de Janeiro.
O presidente do Vasco, em declaração pública, afirmou que só voltaria ao seio dos grandes clubes quando o Vasco fosse maior do que todos eles. Para tal coisa conseguir, o Vasco teria que construir um grande estádio.
O reinado dos arianos durou menos de um ano. Em 1925, os grandes clubes, verificando a potencialidade do Vasco, que dentro em pouco apresentaria o maior estádio do Brasil, abandonaram o racismo e remodelaram totalmente o futebol, permitindo a inscrição de jogadores humildes e concedendo ao clube da Cruz de Malta os mesmos direitos dos clubes fundadores da AMEA.
Com a inauguração do estádio de São Januário, em 1927, o Vasco, que em 1924 era o menor dos grandes, transformou-se no maior entre todos os clubes do Brasil.

No dia do centenário da abolição da escravidão, 13 de maio de 1988, o Clube de Regatas Vasco da Gama fez publicar nos principais jornais cariocas o seguinte anúncio, de página inteira:
13 de Maio
Cem Anos de Abolição
HOMENAGEM DO CLUBE DE
REGATAS VASCO DA GAMA.
UM CLUBE TÃO PRETO E
BRANCO QUANTO O BRASIL.
O Vasco da Gama foi o primeiro clube de futebol a acreditar no talento e na raça do povo negro.
Por causa disto, foi também o mais hostilizado.
Com um time formado por negros, operários e suburbanos, o Vasco foi campeão da segunda divisão em 1922.
No ano seguinte, tornava-se campeão carioca da primeira divisão.
Era um clube do povo.
Na época, o futebol era um esporte de elite. Uma elite que, ao se sentir agredida, exigiu do Vasco a eliminação de doze de seus atletas, todos negros. A decisão foi definitiva: o clube não abriu mão de seus jogadores e retirou-se da Associação Metropolitana de Esportes. Mas as pressões não terminaram. O Vasco foi condenado por não possuir um estádio.
Contra tudo e com a ajuda do povo, construímos então o maior estádio da América Latina.
Muitos quiseram acabar com nosso clube. Mas isto foi em 1923.
O que restou dessa luta ficou imortalizado nas palavras do Presidente do Vasco. Numa resposta histórica.
Hoje, negros e brancos suam a mesma camisa em diversos clubes.
Foi desta mistura que nasceram as cores do Vasco.
É dessa união que dependem as cores do nosso país.
Seguindo-se então o ofício histórico enviado pelo presidente do Vasco à AMEA em 7 de abril de 1924 (reproduzido mais acima); os logotipos das empresas que ajudaram a financiar a publicação do anúncio; e, no pé da página, o emblema do Vasco da Gama.
Que outro clube pode orgulhar-se de poder publicar um anúncio deste teor?
http://www.netvasco.com.br/mauroprais/vasco/racismo.html